Saudade: News from and for the Brazilian community/Notícias de e para a comunidade brasileira

Black Lives Matter everywhere

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Graphic by Ella Mosco.

A tradução deste artigo se encontra no final da versão em inglês

I believe many people are completely overwhelmed in all aspects of life right now. Protests, riots, coronavirus, financial insecurity, while America is crumbling before our eyes.

When I was 6 years old, my mother remarried; she married a man who, much like my father, uncles, and grandfather, was part of the village that raised me. He is Black and my mother is white. He taught me so much about our African roots, among other things about life that I would never have access to it if it weren’t for him. Six years later, my younger sister was born. I was acutely aware of how racism is alive and well in Brazil, but it wasn’t until I witnessed the ramifications in the lives of the people I love that I started to stand up against it.

In 2017, I went to Brazil to spend three weeks; I needed to change my maiden name to my married name, which involved going to various government buildings, and I allocated most of the time to tend to bureaucracy. My younger sister was with me for all of it, and every time she saw me get frustrated, question the system, and demand better answers, she would point out how she would never be able to speak in that way.

One evening, we went to this particularly fancy bakery in the neighborhood where my family resides in Curitiba, Paraná. I asked my sister how frequently she went to that place, and she said that ever since an unfortunate incident happened, she stopped going. She told me that a white lady at the register had refused to accept money from her hands, and that my mother had to pick the money up to pay for their order. I don’t think I had ever been as angry for someone else’s pain as I was at that moment. The woman in question was working that night, and I asked to speak with the manager. I proceeded to tell him what had happened and how appalled I was that such behavior was acceptable in his establishment. Of course, he was apologetic, including to my sister, who at this point was outside. Regardless of his expressed remorse and apology, I felt powerless, and that what I had said was in vain, because I couldn’t remove that painful memory from my sister nor guarantee that it wouldn’t happen again.

I went back to my mother’s house and expressed my anger. She then proceed to tell me about so many cases that had happened over the years in my stepfather’s life, the promotion at his job that went to the white guy who didn’t have the qualifications that he did, how he always has to be dressed in a certain way in their neighborhood because whenever he wore gym clothes, people would cross the street in fear.

The reason why I am writing about this is that much of the consistent violence toward African Americans in the United States is not different from what happens to Blacks in Brazil, and also because if anything, all that is happening has made me realize that I don’t want things to go back to the way they were before this pandemic. I want them to be better for everyone, because public health and racial and socioeconomic disparities are so intertwined there is no possible way to separate them. Racism and prejudice and poverty are public health issues. We don’t get comfortable solutions to uncomfortable problems.

There are many protests happening in Brazil right now due to the many lives taken by Brazilian police during the pandemic. The disdain that the current president is showing for the lives of those who trusted him to make Brazil a better country has motivated people to go to the streets to protest in the middle of a pandemic, when Brazil is an epicenter. On May 30, there was also another protest happening in Brazil’s capital, a white-supremacist protest, and the police didn’t do anything to contain nor stop it, but had no problem exhibiting violence at the protest by people calling for a fair state, protesting the dictatorship that is clearly part of the current’s president agenda. Brazilians are protesting in solidarity with the African Americans in the U.S., and also because they are all too aware of the cruelty of a genocidal and eugenic state. With or without a pandemic, there are Black people who are in permanent social isolation in jails, in life experiences, there are Black and poor people who need to leave to work even in the middle of a pandemic. So between dying at the hands of the state or dying fighting for life, I believe that these people are in the right to choose how, when, and where they will protest.

I read, because I couldn’t watch the video, that George Floyd called out for his mama in his last moments. I can’t stop thinking about that. The fact that he evoked his mother in a moment of desperation says so much. I can’t imagine how difficult it is to be a parent right now who just wants to protect their child from scary times and wants to see them enjoy their childhood. We have this opportunity to raise a generation to care more deeply about protecting people who are vulnerable or different or disadvantaged in a way generations before us have not cared about them. I believe anyone who has any form of a platform needs to speak out right now, as well as be an ally in any way they can, and that is what I am doing. I am reading, I am learning, listening, donating my money to various funds designated to the cause and committed to do and be better. I am not writing this for pats on the back or acknowledgement or affirmation. It is because I am not interested in being a passive ally, no matter where in the world I reside.

Portuguese Translation – Tradução em português

Acredito que nest momento muitas pessoas estão se sentindo completamente sobrecarregadas em todos os aspectos em suas vidas. Protestos, tumultos, coronavírus, insegurança financeira, enquanto parece que os Estados Unidos está se desmoronando diante de nossos olhos.

Quando eu tinha 6 anos, minha mãe se casou novamente; ela se casou com um homem que, como o meu pai, tios e avô, faz parte da vila que me criou. Ele é negro e minha mãe é branca. Ele me ensinou tanto sobre nossas raízes africanas, entre outras coisas sobre a vida que eu nunca teria acesso se não fosse por ele. Seis anos depois, minha irmã mais nova nasceu. Eu tinha plena consciência de como o racismo está vivo e bem no Brasil, mas foi só quando testemunhei as ramificações na vida das pessoas que amo que comecei a me opor a ele.

Em 2017, eu fui ao Brasil passar três semanas; eu precisava mudar o meu nome de solteira para o meu nome de casada, o que envolvia ir a várias repartições públicas, e eu aloquei a maior parte do tempo para a inevitável burocracia. Minha irmã mais nova me acompanhou em todos os agendamentos, e toda vez que ela me via frustrada, questionando o sistema e exigindo melhores respostas, ela falava como nunca seria capaz de fazer o mesmo.

Uma noite, fomos a uma padaria chique no bairro onde minha família reside em Curitiba, Paraná. Perguntei à minha irmã com que frequência ela ia a este lugar e ela disse que desde que um incidente chato tinha acontecido, ela parou de ir. Ela me disse que uma senhora branca a qual estava trabalhando no caixa havia se recusado a aceitar dinheiro de suas mãos e que minha mãe teve que pegar o dinheiro para pagar pela ordem. Acredito que nunca tenha ficado tão enfurecida com a dor de alguém quanto naquele momento. A mulher em questão estava trabalhando naquela noite e pedi para falar com o gerente. Comecei a contar a ele o que havia acontecido e como fiquei horrorizada que esse comportamento fosse aceitável em seu estabelecimento. Claro, ele se desculpou, inclusive à minha irmã, que naquele momento estava do lado de fora da padaria. Independentemente do remorso e do pedido de desculpas expressados, senti-me impotente, e o que eu havia dito foi em vão, porque não conseguiria remover essa dolorosa lembrança da memória da minha irmã nem garantir que isso não ocorresse novamente.

Voltei para a casa da minha mãe e expressei a minha revolta. Ela me contou tantos outros casos que haviam acontecido ao longo dos anos na vida do meu padrasto, a promoção em seu trabalho que foi para o homem branco que não tinha as qualificações que ele possuía, como ele sempre precisa se vestir de uma certa maneira no bairro deles, porque sempre que ele usa roupas de ginástica, as pessoas atravessam a rua com medo.

A razão pela qual estou escrevendo sobre isso é que grande parte da violência consistente contra os negros nos Estados Unidos não é diferente do que acontece com os negros no Brasil, e também porque, se alguma coisa, tudo o que está acontecendo me fez perceber que não quero que as coisas voltem ao que eram antes dessa pandemia. Quero que sejam melhores para todos, porque a saúde pública e as disparidades raciais e socioeconômicas estão tão entrelaçadas que não há como separá-las. Racismo, preconceito e pobreza são questões de saúde pública. Não temos soluções confortáveis ​​para problemas desconfortáveis.

Atualmente, existem muitos protestos no Brasil devido as muitas vidas negras tiradas pela polícia brasileira durante a pandemia. O desdém que o atual presidente está demonstrando pela vida daqueles que confiaram nele para tornar o Brasil um país melhor motivou as pessoas a sairem às ruas para protestar no meio de uma pandemia, quando o Brasil é um epicentro. No dis 30 de maio, houve também outro protesto na capital brasileira, um protesto a favor da supremacia branca, e a polícia não fez nada para contê-lo ou impedi-lo, mas não teve nenhum problema em exibir violência no protesto por pessoas que pediam por um estado justo, protestando contra a ditadura que claramente faz parte da agenda do atual presidente. Os brasileiros estão protestando em solidariedade com os negros nos Estados Unidos e também porque estão cientes da crueldade de um Estado genocida e eugênico. Com ou sem uma pandemia, existem pessoas negras em permanente isolamento social nas prisões, em experiências de vida, há pessoas negras e pobres que precisam sair para trabalhar, mesmo no meio de uma pandemia. Então, entre morrer nas mãos do Estado ou morrer lutando pela vida, acredito que essas pessoas tenham o direito de escolher como, quando e onde protestarão.

Eu li, porque eu não consegui assistir ao vídeo, que George Floyd chamou por sua mãe em seus últimos momentos de vida. Não consigo parar de pensar nisso. O fato de ele ter evocado sua mãe em um momento de desespero diz muito. Eu não posso imaginar o quão difícil é ser pai e mãe neste momento, que só querem proteger seus filhos de momentos assustadores e querem vê-los desfrutar da infância. Temos a oportunidade de criar uma geração que vai se preocupar mais profundamente com a proteção de pessoas vulneráveis, diferentes ou desfavorecidas, de uma maneira que gerações anteriores a nossa não se importaram ou fizeram. Acredito que qualquer pessoa que tenha qualquer forma de plataforma precisa se manifestar neste momento, além de ser um aliado da maneira que puder, e é isso que estou fazendo. Estou lendo, aprendendo, ouvindo, doando meu dinheiro para vários fundos designados para a causa e me comprometendo em fazer e ser melhor. Não estou escrevendo isso para receber tapinhas nas costas, reconhecimento ou afirmação. É porque eu não estou interessada em ser uma aliada passiva, não importa em que lugar do mundo eu esteja.